Sá Carneiro teria feito regionalização, diz CCDRN |
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Público, 09.09.09, Jorge Marmelo
Surgiram, este Verão, novas palavras de ordem em algumas paredes e contentores do lixo da cidade do Porto. Reclama-se a criação de um governo regional e a concretização do processo de regionalização, interrompido pelo referendo de 1998. Ontem, durante a cerimónia de comemoração do 40.º aniversário da comissão consultiva que veio a dar origem à actual Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDRN), o tema dominou também as intervenções, conforme estava prometido, estabelecendo uma ligação entre a rua e os gabinetes.
A regionalização não morreu, portanto, e Carlos Lage, o presidente da
comissão, considera a sua concretização uma condição para o
desenvolvimento económico regional. "Esse combate ainda está por
vencer", disse, acrescentando que os próximos tempos serão fundamentais
para decidir se a Região Norte passará a ser uma realidade "emancipada
e senhora do seu destino" ou se, pelo contrário, ficará sujeita a
interesses alheios.
"É particularmente grato constatar como um tão elevado nível de
competência surgiu do nada [com a criação da Comissão Consultiva
Regional] e sobrevive até hoje, mantendo a competência técnica e um
inesperado entusiasmo e empenhamento, que sobrevive ao atraso
inexplicável do processo de regionalização", comentou o
constitucionalista Pedro Bacelar de Vasconcelos, que, a propósito,
considerou inconstitucional a disposição que obriga a regionalização a
ser aprovada pela maioria dos eleitores e não apenas pela maioria dos
votantes. "É uma condição para o insucesso do processo", comentou,
secundado por Lage, para quem é preciso tornar o referendo "leal, justo
e equitativo".
Respondendo ao argumento de que a regionalização implica custos que o
país não pode pagar, Bacelar de Vasconcelos questionou se alguma vez se
contabilizaram os custos da estrutura defeituosa que priva o
desenvolvimento de uma estrutura intermédia de poder, também reclamada,
na cerimónia, pelo presidente do Conselho da Região, Francisco Araújo,
o qual fez votos para que a CCDRN "seja a génese de um poder regional
forte e dinamizador".
Uma das mais surpreendentes intervenções pertenceu a Luís Braga da
Cruz, segundo o qual a comissão - a que presidiu entre 1986 e 2001 -
teve sempre como objectivo "dotar a região de elementos de
competitividade que lhe faltavam, tendo em vista a concretização da
regionalização". Considerando que o referendo de 1998 constituiu "uma
manobra de diversão para manter o centralismo do Estado", Braga da Cruz
narrou como, há algum tempo, encontrou em casa o programa eleitoral da
AD, de 1979, e constatou que este dedicava três páginas ao pensamento
regionalista. "Estou convencido de que, se [o então primeiro-ministro]
Sá Carneiro não tivesse morrido, já não estaríamos a discutir a
regionalização", disse.
Braga da Cruz e Valente de Oliveira (que liderou a comissão entre 1975
e 1985) recordaram os pontos mais marcantes das respectivas
presidências, da criação dos Gabinetes de Apoio Técnico às autarquias
aos programas operacionais regionais, passando pelo Plano de
Desenvolvimento Rural Integrado de Trás-os-Montes e pela negociação da
ajudas de pré-adesão à então CEE, que permitiram, por exemplo,
concretizar a navegabilidade do Douro. "O grande segredo desta casa foi
estudar", resumiu Valente de Oliveira.
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