Público, 28.08.089, António Arnaldo Mesquita
A Unidade Especial de Investigação à Câmara de Lisboa acusou o arquitecto Jorge Contreiras de corrupção, branqueamento de capitais, abuso de poder e falsificação de documento. O arguido era assessor de uma das divisões de gestão urbanística da autarquia e terá dado pareceres favoráveis a processos elaborados por um gabinete de projectos de que era sócio.
A primeira situação referida na acusação do procurador-adjunto Ricardo
Matos, magistrado da equipa coordenada por Maria José Morgado, respeita
a um projecto de um promotor imobiliário conhecido do arguido.
Contreiras propôs-se contribuir para a celeridade na aprovação do
projecto, obtendo como contrapartida que a elaboração do mesmo seria
feita pela Newspace, firma a que estava ligado. O projecto seria,
todavia, assinado por uma arquitecta que colaborava com o gabinete, que
subscreveu um contrato de prestação de serviços com o empreiteiro.
Segundo a acusação, o promotor nunca se deslocou à divisão de
urbanismo, sendo sempre informado por telefonemas do arguido, que se ia
inteirando do andamento do processo junto de outros arquitectos
camarários. Os honorários ascenderam a 125 mil euros, acrescidos de
26.250 euros de IVA e foram depositados inicialmente na conta da
arquitecta. Esta acabaria por transferir 90.750 euros, dos quais 15.750
de IVA, para uma outra conta da Newspace. Foi esta triangulação que
motivou a imputação do crime de branqueamento ao arquitecto Jorge
Contreiras, não tendo ficado provado que a arquitecta tivesse sido
cúmplice na dissimulação da origem daquela verba.
Uma outra situação investigada refere-se ao licenciamento de uma
construção na Rua do Conde Redondo, em Lisboa, cujo projecto também foi
elaborado pela sociedade Newspace e assinado pela mesma arquitecta.
Neste caso, houve reservas dos serviços de urbanismo da CML, que seriam
superadas através de uma informação subscrita pelo arguido, que o
Ministério Público sustenta consagrava soluções contrárias às previstas
no Plano Director Municipal e Regulamento das Edificações Urbanas. E
foi com base nessa informação que o projecto foi aprovado em Maio de
2003, pela vereadora do pelouro do Urbanismo, Eduardo Napoleão.
Em pelo menos três projectos elaborado pelo gabinete de que era sócio,
Jorge Contreiras terá fabricado documentos com assinatura falsa, de
modo a agilizar o deferimento do licenciamento, com a inerente
aceleração do ritmo dos trabalhos de construção e comercialização dos
prédios.
Jorge Contreiras estava autorizado, desde Outubro de 2003, a exercer a
actividade privada de arquitectura, design interior e urbanismo em
horário pós-laboral, mas apenas fora da área geográfica abrangida pelas
funções que desempenhava na Câmara de Lisboa. Este inquérito é um dos
poucos até agora abertos pelo Ministério Público visando esclarecer a
licitude da actividade dos quadros da administração que se pronunciam
sobre projectos elaborados por sociedades a que estão ligados. O
PÚBLICO procurou, em vão, ao fim da tarde de ontem contactar o
arquitecto Jorge Contreiras para obter uma reacção à acusação deduzida
pela equipa coordenada pela procuradora Maria José Morgado.
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