Público, 26.08.09, Ana Henriques
As marquises nas fachadas dos prédios são um dos alvos de uma campanha que arranca no mês que vem para sensibilizar a população para os aspectos estéticos do fenómeno. As caixas de ar condicionado e os estendais também vão estar na berlinda nesta iniciativa, que, apesar de ter o apoio do Ministério do Ambiente, partiu de um gestor privado.
Aos 56 anos, Luís Mesquita Dias, que é presidente do conselho de
administração da Unilever-Jerónimo Martins, decidiu que era altura de
chamar a atenção dos portugueses para um fenómeno que diz nunca ter
visto em parte nenhuma da Europa desenvolvida senão aqui - apesar de
ter morado vários anos em Barcelona e Bruxelas e também em Banguecoque:
"Choca-me ver o meu país degradar-se. Estamos a hipotecar a nossa
paisagem urbana". Depois de, há 12 anos, ter tentado - sem sucesso -
sensibilizar todas as câmaras municipais e várias outras entidades para
a necessidade de pôr cobro àquilo que designa por "desordem
urbanística", resolveu agir.
Um spot televisivo, outro radiofónico e
cartazes nas ruas de Lisboa são as armas de que se muniu para desafiar
a "impunidade com que se intervém nas fachadas dos prédios" e "a falta
de controlo das entidades" responsáveis pela fiscalização.
Com apenas
30 segundos, o spot televisivo mostra algumas marquises dos milhares
delas que têm sido fechadas clandestinamente, aparelhos de ar
condicionado colocados de forma indiscriminada e estendais "com cuecas
que teimam em pingar", como diz a voz off do vídeo. "A cidade que temos
é a cidade que fazemos", lê-se no final.
Casado e com dois filhos,
Luís Mesquita Dias está ciente das reacções negativas que esta campanha
- à qual se associaram parceiros não só institucionais como também
privados, que pagaram os custos das suas diferentes vertentes - vai
desencadear. As famílias com muitos filhos vão dizer que não têm outra
alternativa senão pôr uma das crianças a dormir na marquise, antevê.
"Mas não há famílias nos países onde o fenómeno nunca atingiu
proporções semelhantes às portuguesas?", questiona.
Realista, o gestor
sabe que é impossível arrancar as centenas de milhares de marquises
clandestinas espalhadas pelo país. Por isso, apresenta uma solução: a
colocação de estores brancos nestas excrecências acrescentadas às
varandas. O
bastonário dos arquitectos, João Rodeia, ignorava a campanha que aí
vem. Mas congratula-se por um particular ter resolvido chamar a atenção
para o problema. "Não conheço outro país europeu em que isto aconteça",
confirma. "Em Espanha as varandas têm toldos e as pessoas usufruem
delas sempre que o bom tempo o permite". Então o que se passa em
Portugal? "É uma questão de educação cívica", responde o bastonário. "E
cada varanda tem um sistema de fecho diferente, o que desfigura ainda
mais os edifícios". "Compreendo a necessidade de espaço das pessoas,
mas todos têm o direito a que as cidades não fiquem desfiguradas",
acrescenta, referindo os anos e anos de permissividade das autoridades.
"O que é mais angustiante é que a maioria das pessoas habituou-se a
estes fenómenos e não os acha estranhos". Embora arranque em Lisboa, a
campanha deverá estender-se ao Porto e eventualmente a outras cidades.
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