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Igespar receia desaparecimento da arquitectura escolar Imprimir E-mail

Público, 16.08.2009, Clara Viana

Aquilo que o ministério pretende para o novo ensino - um certo tipo de utilização de novas tecnologias e as novas regras de conforto e segurança - "não permitirá manter muitas das características" dos edifícios que albergam os poucos liceus históricos do país, admitiu ao Público Hermínio Ferreira, director do Departamento de Salvaguarda do Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (Igespar).

Contudo, são essas as regras do programa ao abrigo do qual foram já transformadas, ou estão a sê-lo, as escolas secundárias Passos Manuel (situada num antigo convento), Pedro Nunes (um projecto de Ventura Terra) e Filipa de Lencastre (desenhado por Carlos Ramos), em Lisboa, Rodrigues de Freitas (da responsabilidade de Marques da Silva), no Porto, e Diogo Gouveia (obra de Cristino da Silva), em Beja. Todas elas integram o grupo de liceus tido como uma referência da arquitectura moderna portuguesa, sendo alguns exemplares únicos.

Respondendo por e-mail ao PÚBLICO, a arquitecta Teresa Heitor, porta-voz da Parque Escolar, a empresa pública criada para esta operação, garantiu que nos edifícios com valor patrimonial "a correcção de problemas fisíco-construtivos, ambientais e as adaptações funcionais são realizadas sem a adulteração dos valores preexistentes, procurando minimizar o impacto das intervenções". "As obras têm como objectivo garantir a eficácia dos equipamentos, racionalizando a distribuição dos espaços lectivos e introduzindo as áreas necessárias à sua compatibilização com os novos conteúdos curriculares e com um modelo de escola a tempo inteiro, inclusiva e aberta à comunidade", frisou.

Mas esta explicação não convence os críticos. É o caso do arquitecto Gonçalo Canto Moniz, autor de vários estudos sobre arquitectura escolar, que aponta dois exemplos: "O encerramento com um novo edifício do pátio aberto do Liceu Pedro Nunes ou o acrescento de um piso no corpo principal do Liceu Filipa de Lencastre comprometem um valor arquitectónico que a Parque Escolar tem como objectivo valorizar". "A adaptação do programa aos edifícios existentes devia salvaguardar as suas qualidades arquitectónicas originais", defende.
Como os projectos foram adjudicados por ajuste directo, sem divulgação pública dos projectos, a avaliação do resultado final só poderá ser feita após a conclusão das obras. Mas sabe-se que lambris de azulejo têm sido removidos, caixilharias em ferro sido substituídas por outras em alumínio e pavimentos de madeira por novos de linóleo.

Gonçalo Moniz chama ainda a atenção para os "muitos riscos patrimoniais" da operação, muito diferentes de edifício para edifício. Intervir na D. Dinis, em Lisboa, uma construção em pavilhões dos anos 1970, ou na Rodrigues de Freitas, no Porto, que data do princípio do século XX, "coloca problemas distintos". Por isso, "os prazos de elaboração dos projectos de arquitectura e de especialidades deveriam contemplar" a diferente complexidade dos projectos, defende.

Mais: na sua opinião "corre-se o risco de o programa, em todas as suas componentes, ficar refém da urgência em cumprir o projecto político do Governo", adverte.

Intervir ou fechar
Já o responsável do Igespar defende que, a par da preservação da memória, existe o problema do uso a dar aos imóveis. Para ele, devido ao estado em que se encontravam e à necessidade de obedecer às exigências do programa, não intervir equivaleria a encerrar aquelas escolas.

Este argumento não convence Ana Vaz Milheiro, para quem existiam outras opções. Com um ponto de partida prévio: assumir que existem edifícios "que não aguentam o programa que está definido". Esta opção permitiria preservar o seu "valor patrimonial" e, ao mesmo tempo, garantir a sua funcionalidade através de um programa de restauro integral: o espaço físico das escolas é o retrato de uma época, de um modelo de ensino.

Apesar de não conhecer os projectos, o antigo director do Instituto Português do Património Arquitectónico, Paulo Pereira, que estudou no Pedro Nunes, diz que "dificilmente edifícios como esse são modernizáveis". "Existe, quando muito, a possibilidade de tornar funcionais determinados espaços, mas sem desperdiçar aquilo que deveria ser preservado, como as bibliotecas ou os laboratórios".

Hermínio Ferreira contrapõe que o risco de ruína de um edifício sem uso é maior, pelo que, estando salvaguardada a linguagem arquitectónica exterior, a intervenção se justifica, embora devesse ser discutida.
No conjunto, o Igespar deu parecer e está a acompanhar cerca de 100 projectos - o que é obrigatório por lei, porque se trata de imóveis que se encontram em vias de classificação ou que estão inseridos em zonas de protecção especial. Os processos têm sido aprovados, mas pelo menos em cinco casos os pedidos de apreciação chegaram ao Igespar já depois do início das obras. Foi o que aconteceu, por exemplo, com as escolas secundárias Passos Manuel e Filipa de Lencastre, em Lisboa, e Rodrigues de Feitas, no Porto.


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