Público, 26.06.2009, Inês Boaventura
O corredor em pedra a ligar o arco da Rua Augusta ao Cais das Colunas desapareceu, os losangos da placa central foram esbatidos, a estátua de D. José passou a assentar num círculo em vez de um losango e o Cais das Colunas não vai ser transformado numa plataforma circular. O estudo prévio para o projecto do arquitecto Bruno Soares para o Terreiro do Paço acolheu, segundo disse ontem o próprio, "grande parte das críticas" que foram feitas por cidadãos, técnicos e órgãos de administração, e tem a "concordância" do Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (Igespar).
Em conferência de imprensa, o arquitecto admitiu que a versão
preliminar do projecto era "criticável" e tinha aspectos que
"claramente tinham que ser revistos", salientando que, "obviamente, um
projecto não resulta de um somatório de opiniões", sendo necessário
fazer "um balanço e valoração dos vários contributos".
Já o presidente da sociedade Frente Tejo refutou as críticas que têm
sido feitas pela inexistência de um concurso público para escolher o
autor do projecto e pela falta de um debate público, afirmando que
houve "uma auscultação ampla", da qual resultaram "contributos muito
relevantes e importantes". "Consideramos estar a cumprir os princípios
da participação e da transparência", concluiu Biencard Cruz.
Quanto ao facto de a versão preliminar ter sido chumbada pelo Igespar,
pelo impacto visual, arrumação da placa central e enquadramento da
estátua, o presidente da sociedade garantiu, em declarações aos
jornalistas à margem da conferência de imprensa, que o projecto revisto
tinha tido "parecer favorável sem condicionantes". Horas mais tarde, a
assessora de imprensa da Frente Tejo corrigiu esta informação,
afirmando que, afinal, "o projecto ainda não foi formalmente aprovado
pelo Igespar, porque esta versão não foi ainda submetida oficialmente
para o efeito", existindo apenas "acordo de princípios".
Os losangos
Acolhendo aquela que foi uma das maiores críticas ao desenho inicial,
Bruno Soares manteve os losangos no chão da placa central, mas decidiu
optar por "uma proximidade de cores e tons muito grande". Tanto a base
como as linhas diagonais que nela vão ser traçadas serão em lioz, mas
enquanto a primeira será numa pedra fina e granulada para manter a
imagem do antigo terreiro, as linhas serão de pedra lisa.
"Não vamos determinar como se usa a praça através do chão", garante o
arquitecto, explicando que insistiu nos losangos para "dar a perceber
que é uma grande praça, não um espaço estático e fechado". O também
muito contestado corredor em pedra a unir a Rua Augusta ao Cais das
Colunas desapareceu e a estátua de D. José deixou de assentar num
losango, opção que Bruno Soares admite ter sido "um erro".
Na nova versão do estudo, a estátua será "bordejada por uma faixa de
pedra" e continuará a estar sobreelevada, a uma altura que num dos
lados atingirá os 30 centímetros. Também a polémica sobreelevação da
placa central do Terreiro do Paço em relação ao Cais das Colunas se vai
manter, apesar de os cinco degraus inicialmente previstos serem agora
transformados em dois degraus seguidos de um patamar e mais dois
degraus, o que, na opinião do arquitecto, torna a aproximação "mais
suave".
Aqui, a grande diferença é que o Cais das Colunas, que o arquitecto considera ser o elemento "mais importante" da praça e aquele que a
"diferencia de qualquer outra praça real", não será transformado numa
plataforma circular. Bruno Soares explica que a insistência nos
contestados degraus, que serão ladeados por "duas rampas muito suaves",
"não é para dificultar a circulação, é para as pessoas terem a
percepção de que é uma situação diferente".
As esplanadas
Já os passeios nas laterais, que vão ser alargados e receberão
esplanadas, continuarão a ter "um padrão das cartas de marear do século
XVI", num material ainda a definir, mas que se prevê que seja
atravessado por linhas vermelhas e pretas. O passeio junto à Avenida
Ribeira das Naus que, com a introdução do novo modelo de circulação
automóvel, passou a ter duas faixas em calçada de granito, será em
calçada à portuguesa.
O que também se mantém, apesar de ter gerado contestação, é o desnível
entre o centro da praça e uma das laterais do Terreiro do Paço, onde,
segundo Bruno Soares, haverá um lancil com 15 centímetros e dois
socalcos com 25 cm cada, para "revelar o acontecimento histórico" que
foi o abatimento do torreão poente.
As árvores
Já a possibilidade de plantar árvores na praça, onde estas chegaram a
existir nos séculos XIX e XX, foi rejeitada pelo arquitecto, por
considerar que iriam "segmentar o espaço" e contribuir para se "perder
a sua dimensão". Além disso, explicou, a vizinha Avenida Ribeira das
Naus vai ser arborizada, pelo que não fazia sentido "deturpar a Praça
do Comércio nem pô-la a concorrer com outros espaços".
O autor do estudo para o projecto de requalificação, que se pretende
esteja concluída a tempo da comemoração do centenário da implantação da
República, em Outubro de 2010, quer que esta passe a ser uma praça
utilizada no Verão e no Inverno, de dia e de noite, no quotidiano e em
festas e outros acontecimentos. Para tal vão ser desenvolvidos
projectos específicos de iluminação e de mobiliário urbano, que
contemplará palcos, instalações temporárias, apoios para exposições,
mercados e esplanadas.
Bruno Soares diz que a alteração já introduzida pela câmara na
circulação automóvel, que estiveram na origem de uma providência
cautelar interposta pelo Automóvel Clube de Portugal, "é fundamental, é
essencial para sustentar esta remodelação". Igualmente importantes,
acrescentou, são os projectos de reutilização dos edifícios da praça (e
de toda a Baixa) e e recuperação das suas fachadas.
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