Público, 12.06.2009, Carlos Cipriano
O investimento em transportes públicos aumenta quase sempre o valor dos terrenos por onde passa. Um prolongamento da rede de metro, ou a construção de uma nova estação entre duas já existentes, espalham à sua volta um acréscimo de valor dos terrenos e dos imóveis localizados. O tema é complexo, mas foi este desafio que José Carballo Sequeira, director do gabinete de auditoria do Metro de Lisboa, propôs a algumas centenas de especialistas numa apresentação ao Congresso da União Internacional dos Transportes Públicos (UITP), que ontem encerrou em Viena, Áustria.
É justo, pois, que se criem mecanismos para ir buscar esse valor a quem
dele beneficia sem que para tal tenha contribuído, e o ponha ao serviço
da comunidade financiando o próprio investimento. Uma taxa sobre os
benefícios gerados pela nova rede de transportes é um dos três
mecanismos possíveis, que visa introduzir alguma justiça quando um
investimento público destinado à população acaba por gerar enormes
valorizações às propriedades de uma minoria.
José Sequeira diz que é isto que está a ser feito na expansão do metro
de Londres e que a mesma experiência foi pacífica também em Washington,
quando se construiu uma nova estação em terrenos desqualificados que
passaram a valer uma fortuna.
Mas em vez de se fazer primeiro o investimento e depois se aplicarem as
taxas, é possível uma solução mais elaborada que consiste em antecipar
os benefícios esperados utilizando-os para financiar a infra-estrutura.
"Neste caso, pede-se ao banco para financiar o investimento e dá-se
como garantia os futuros ganhos sobre os valores dos terrenos", explica
este investigador, que estudou o caso australiano, onde este mecanismo
é aplicado, e o de Chicago, onde a forma de financiamento é utilizada
em grande escala. Por fim, uma terceira possibilidade consiste em
juntar a construção de uma infra-estrutura de transportes com o
desenvolvimento urbano, em que o próprio operador e entidades privadas
se envolvem na requalificação dos locais por onde passa a nova rede.
As pessoas têm a percepção de que uma estação de metro implantada num
bairro muda completamente o tipo de serviços e de actividades que ali
passam a funcionar. A ideia, diz José Sequeira, "é aproveitar o valor
das vendas e das rendas desses espaços para financiar o investimento,
mas, em vez de taxas, o próprio Estado [ou o seu operador]
contratualiza com os privados a venda e arrendamento das propriedades,
partilhando os benefícios. E, mais uma vez, há exemplos de sucesso: em
Hong Kong o operador de transportes trabalha em conjunto com os
promotores imobiliários privados e o mesmo tem acontecido em Madrid, na
área metropolitana de Copenhaga, na Índia e no Brasil.
Em Portugal, porém, há uma quase ausência de reflexão em torno destas
questões, continuando as empresas responsáveis pelas infra-estruturas
de transportes - sobretudo a Refer e os Metros de Lisboa e do Porto - a
endividar-se para prosseguir com os investimentos.
A estação do metro do Colégio Militar é um caso-tipo de como um
investimento público gerou valor para os privados, bem aproveitado pela
Sonae, no Colombo, e pelo grupo BES, no Hospital da Luz.
José Sequeira, que faz parte da Comissão de Economia de Transportes da
UITP, diz que estas inovadoras fontes de financiamento são, ainda por
cima, amigas das finanças públicas. Estudadas, sobretudo, na
perspectiva das redes de metro, estes mecanismos podem também ser
extrapolados para investimentos de maior dimensão, como é o caso do
novo aeroporto e das estações da rede de alta velocidade.
O congresso da UIPT juntou em Viena 2200 delegados oriundos de 80
países e 350 empresas que ocuparam uma área de exposição de 26 mil
metros quadrados. O tema deste ano foi a Mobilidade e Transporte nas
Cidades.
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