Público, 10.06.2009, Ana Henriques
Enfiar uma varanda numa marquise ou pespegar-lhe com uma janela de alumínio passou a ser uma proeza mais difícil no Bairro Azul. A Câmara de Lisboa aprovou ontem a classificação patrimonial do bairro como conjunto de interesse municipal, de forma a preservar a identidade deste exemplo de art deco criado nos anos de 1930 e ampliado nos anos 60 junto à Praça de Espanha.
Foram precisos quatro anos para isso acontecer: iniciado em 2005, por
pressão da comissão de moradores do bairro, o processo de classificação
só agora terminou. A proposta ontem aprovada refere que o local
"representa um valor cultural com significado para o município,
reflectindo (...) valores de memória, autenticidade, originalidade e
exemplaridade". Quem hoje passa no bairro não adivinha de onde lhe vem
o nome: o azul não está presente praticamente em lado nenhum. Mas eram
dessa cor as persianas originais dos prédios. E porque não voltarem a
sê-lo? Essa é uma das pretensões dos representantes dos moradores.
A razoável preservação do bairro onde intervieram arquitectos como
Cassiano Branco e Norte Júnior - não obstante "a presença de alguns
elementos dissonantes" reconhecida pela autarquia - foi fundamental
para a classificação. Segundo o vereador do Urbanismo, Manuel Salgado,
a câmara elaborará agora um regulamento urbanístico que estabelecerá
"as regras de transformação dos edifícios" de agora em diante. O
reperfilamento das ruas e a sua arborização são também promessas dos
responsáveis da autarquia.
Menos pacífica do que a classificação do Bairro Azul na reunião de
câmara de ontem foi a apreciação do projecto para o novo Museu dos
Coches. A maioria socialista bateu-se por uma aprovação favorável
condicionada - até porque o local para onde está previsto o novo
edifício, defronte da estação de comboios de Belém, é vulnerável a
sismos e inundações -, mas a votação do assunto acabou por ser adiada.
A vereadora independente Helena Roseta invoca a lei para exigir uma
audição pública sobre o projecto. "A Sociedade Frente Tejo [promotora
da obra] não tem seguido os preceitos legais que obrigam à existência
de concursos públicos para a adjudicação de projectos de obras
públicas", refere uma proposta sua que irá ser discutida quando o museu
for a votos na câmara.
Gorada foi ontem também a pretensão do Benfica de construir mais do que
o permitido num lote de terreno vago que detém no Alto dos Moinhos,
obtido há muitos anos no âmbito dos apoios da Câmara de Lisboa aos
clubes desportivos. O presidente da câmara, António Costa, absteve-se
de usar o seu voto de qualidade para beneficiar o Benfica. E os
comunistas mostraram-se indignados perante as frequentes dádivas do
município aos grandes clubes. Rita Magrinho recordou que os apoios
camarários à construção dos dois estádios para o Euro 2004 tiveram como
contrapartida a construção nestes recintos de pistas de atletismo que
pudessem ser usadas por todos os munícipes. "Hoje temos dois estádios a
500 metros um do outro, sem que estas pistas existam", criticou o
também comunista Ruben de Carvalho.
"Era demasiada carga construtiva para aquela zona da cidade", observou
o vereador independente José Sá Fernandes, que ajudou a chumbar a
proposta de Manuel Salgado, da bancada socialista, destinada ao aumento
da área de construção permitida no Alto dos Moinhos.
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