Público, 05.06.2009
A directora do Museu dos Coches, Silvana Bessone, entende que o projecto de reformulação do Terreiro do Paço "desvirtua o conceito de praça barroca" que presidiu à criação da Praça do Comércio após o terramoto de 1755. "Achei o desenho horrível e como historiadora de arte fiquei impressionada", diz Silvana Bessone, que assinou ontem a petição online a exigir a abertura de uma discussão pública sobre o futuro da principal praça do país.
Uma pretensão que não é bem acolhida pela Sociedade Frente Tejo,
entidade de capitais exclusivamente públicos criada pelo Governo para
reabilitar este e outros troços da zona ribeirinha de Lisboa. "Pela lei
não somos obrigados a fazê-lo, uma vez que se trata de um projecto e
não de um plano. Mesmo assim, abrimos um processo de participação
pública nesta fase inicial do projecto, que é a do estudo prévio",
refere a porta-voz da sociedade, Maria João Rocha.
A directora do Museu dos Coches explica que a Praça do Comércio "foi
feita de propósito para ali fazer passar os grandes cortejos do fausto
barroco [com carruagens puxadas por cavalos], que davam voltas em redor
da placa central e subiam depois pela Rua da Prata ou pela Rua do
Ouro". Por isso, "transformar aquilo novamente num terreiro", o
Terreiro do Paço que ali existia antes do terramoto, "não faz sentido".
Da mesma forma, o corredor de pedra que o projecto prevê que venha a
ligar o arco da Rua Augusta ao Cais das Colunas "é um disparate", tal
como a anunciada valorização da estátua de D. José com alguns degraus
em seu redor.
Silvana Bessone faz um apelo: que antes de ser tomada qualquer decisão
precipitada o assunto seja discutido não apenas pelos cidadãos como por
um painel de especialistas - historiadores de arte, arquitectos,
urbanistas, olisipógrafos - que possa indicar um rumo a seguir na
reabilitação da praça. De facto, existe um painel de especialistas que
já transmitiu ao autor do projecto, o arquitecto Bruno Soares, as suas
impressões sobre o seu trabalho. E o PÚBLICO sabe que levantaram várias
objecções. "Não vamos revelar publicamente o conteúdo deste debate
interno com os especialistas, senão ele deixaria de ser produtivo", diz
a porta-voz da Sociedade Frente Tejo. Objecções ao projecto levantaram
igualmente vários serviços camarários. Num parecer que emitiu sobre o
assunto, o director municipal de Conservação e Reabilitação Urbana,
Catarino Tavares, entende que a sobriedade e a simplicidade da imagem
pombalina dificilmente se coadunam com a variedade de materiais e de
cores que Bruno Soares previa inicialmente que fossem usados no
pavimento - "lioz, basalto, calcário, vermelho e amarelo, granito,
saibro e mármore verde". Este será um dos aspectos que o arquitecto
estará a reformular até ao próximo dia 26 (ver outro texto).
"Deverá meditar-se sobre os materiais a aplicar e as soluções propostas
para os desníveis [previstos para o pavimento] junto do torreão
poente", conclui o responsável camarário, que elogia a prioridade que o
projecto confere aos peões, "não incluindo qualquer obstáculo" à sua
circulação. A.H.
|