i, Filipe Morais, 29 de Maio de 2009
O estacionamento em Lisboa pode vir a ficar mais caro. O vice-presidente da câmara de Lisboa, Manuel Salgado, considera que estacionar na cidade deve custar mais do que custa hoje e que essa pode ser uma ferramenta para um dos objectivos do Plano Director Municipal, que começa a ser agora discutido. Retirar carros da cidade e apostar nos transportes públicos é a ordem, nem que para isso seja necessário levar os locais de emprego para onde estão os transportes públicos.
Esta é uma das apostas do executivo de António Costa na Câmara
Municipal de Lisboa para a revisão do Plano Director Municipal (PDM), o
instrumento de ordenamento da cidade. O plano em vigor foi aprovado há
15 anos e três dias na Assembleia Municipal.
O próximo planeamento da cidade vai ser feito em torno das grandes
obras que estão previstas, como a terceira travessia do Tejo, a saída
da CREL para Lisboa, a saída do aeroporto da Portela da cidade e a
reestruturação do porto. E tudo numa época de crise que obriga a
"pensar Lisboa no futuro, com a nova economia e com todos os problemas
de criação de emprego", disse ao i o vice-presidente da câmara, Manuel
Salgado, que tem o pelouro do Urbanismo e a tutela a revisão do PDM.
Uma das prioridades na mudança é a "recomposição social de Lisboa,
evitando que as pessoas continuem a sair da cidade" e para isso há que
mudá-la. O alvo a abater será o transporte individual, mas agora com
uma mudança de estratégia Mais do que campanhas para promover a oferta
de transportes públicos, a equipa de António Costa quer dificultar a
vida aos automóveis em Lisboa. Além das mudanças na circulação, Manuel
Salgado defende que "o preço do estacionamento deve ser mais caro,
porque é espaço público que está a ser ocupado".
"Temos que reduzir a oferta de estacionamento. Actualmente, o PDM prevê
um mínimo de dois lugares de estacionamento a cada 100 metros, mas
queremos que o novo plano possa estabelecer um número máximo de
lugares." No entanto, sublinha que esta possível subida de preços para
o estacionamento à superfície "é uma responsabilidade da Empresa
Pública de Estacionamento de Lisboa (EMEL).
As restrições à circulação aos automóveis na capital passam ainda pelo
aumento do estacionamento condicionado na via pública a todo o
concelho, introdução de limite máximo de velocidade de 30 km/h em todos
os bairros - de forma a cortar o tráfego de atravessamento - e redução
de segundas filas de trânsito no eixo-central (Baixa, Avenida da
Liberdade, Fontes Pereira de Melo e Avenida da República) para metade
das que existem hoje.
Para que não haja desculpas para não aumentar o uso dos transportes
públicos em Lisboa, o vice-presidente da autarquia quer deslocalizar
centros empresariais e comerciais para juntos dos principais terminais
de transportes públicos: casos de Sete Rios, Alcântara e Parque das
Nações. "Se os empregos estiverem mais perto dos transportes, não há
por que não usá-los. E isso pode aplicar-se também aos equipamentos,
como tribunais ou hospitais."
INVESTIR NO CENTRO Manuel Salgado garante que não descura "o urbanismo
de proximidade, que pode resolver os problemas do dia-a-dia das
pessoas". "Temos que recompor socialmente a cidade", diz. Para isso,
admite aplicar o PDM "em escalas de tempo e em escalas de detalhe",
para resolver questões como o vale de Alcântara, a ligação com a
embocadura do rio, os planos de pormenor na zona da Boavista, ou a
intervenção na Baixa da cidade e Parque Mayer - projectos de curto
prazo, mas com grande impacto em Lisboa. "Num momento de escassez de
recursos, o que for feito tem de ser muito bem feito, tem de ter muita
qualidade. E quer sejam iniciativas públicas quer sejam iniciativas
privadas, terão que ir sempre no sentido de valorizar." Aqui, Manuel
Salgado dá os exemplos da recuperação da frente rio e do projecto
previsto para o Terreiro do Paço, que vão aumentar as áreas para peões
e condicionar a circulação de carros - "que é, de facto, o que nos
pedem". Em discussão vai estar também o modelo da cidade: uma com
pessoas a viver na periferia e que vêm trabalhar no centro, ao estilo
norte-americano, ou uma com mais pessoas a viver e a trabalhar no
centro, ao estilo europeu. A câmara inclina-se mais para a segunda
opção.
Como exemplo de um caso pouco pensado para as pessoas, o arquitecto
Eduardo Leira, autor do projecto da Alta de Lisboa (e que vai estar
hoje presente na conferência "Uma Cidade para o Futuro. O PDM de
Lisboa"), referiu ontem que a "mentalidade da prioridade ao carro está
aplicada em toda a estrutura viária". As estações de Metro mais
modernas são um exemplo: "São quimicamente puras. São bonitas, mas
quase parece que as pessoas incomodam e têm de pedir licença para se
sentarem. Estes são espaços que têm de ser desenhados para as pessoas,
com cafés, locais para se sentarem e onde se sintam bem". Leira defende
também que é necessário passar a mensagem. "Há uns anos o carro era um
bem social, mas hoje todos temos carro. Só não o usem é para vir à
cidade!".
ALERTAS A proposta de PDM que começa a ser discutida define como
oportunidades a melhoria de acessibilidades e atractividade
internacional de Lisboa por via da construção das ligações ferroviárias
de alta velocidade ao Porto e a Madrid e determina que a cidade tem que
assumir-se como porta de entrada na Europa para empresas e investidores
do espaço lusófono. Isto apesar das ameaças do risco de centralização
em Madrid (e Barcelona) de empresas vocacionadas para o mercado ibérico.
Com o início da discussão, a oposição na autarquia de Lisboa já lançou
alertas. A independente Helena Roseta lembra que esta é uma fase
inicial da discussão. "Há muito trabalho técnico feito, mas falta a
ligação com uma estratégia para a cidade, num modelo relativamente cego
a nível social, porque Lisboa tem muita gente, população pobre e
envelhecida, nos bairros críticos. O PDM devia incluir uma estratégia
para estes bairros e não definir apenas as oportunidades imobiliárias.
É preciso não esquecer que aqui estão também muitos jovens. Se
melhorarmos a vida nestes bairros, melhoramos também a vida na cidade."
De resto, Roseta espera "que realmente se consiga retirar carros de
Lisboa, mas a cidade sozinha não consegue fazê-lo. O aumento de preços
do estacionamento pode ser uma ideia, mas o que é preciso é que haja
soluções para as pessoas, como passes familiares. As pessoas fazem
contas e mesmo com o aumento de preços, uma família junta-se e pode
ficar mais barato levar o carro."
PSD contra Já Margarida Saavedra, vereadora do PSD, ataca a conferência
de hoje, por considerar que "a câmara está a pagar a campanha de
António Costa". Sobre a proposta de PDM, disse ao i que "não tem
viabilidade" e defendeu a manutenção do aeroporto da Portela: "Lisboa
não pode ficar sem aeroporto, precisamos de um que assegure pelo menos
os voos domésticos". A vereadora laranja diz ainda que não quer uma
terceira travessia do Tejo porque "o tráfego vai aumentar em 30%" e "os
camiões TIR terão de passar pela rua do Arsenal, para atravessar o
rio". Quanto ao porto, é necessário "mas não é preciso que triplique de
tamanho. Lisboa não é uma cidade portuária".
Apesar do início da discussão do plano, ontem o Conselho de Ministros
aprovou duas suspensões parciais do PDM, por dois e três anos, para
viabilizar a construção das instalações da Polícia Judiciária, na Gomes
Freire, e uma subestação da Rede Nacional de Transporte de
Electricidade, em São Francisco Xavier. com Alexandre Soares
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