in Público, 28.05.2009, Ana Henriques
O presidente da Câmara de Lisboa, António Costa, foi ontem obrigado a exercer o seu voto de qualidade para conseguir fazer aprovar pela autarquia os planos de remodelação do Terreiro do Paço elaborados pelo arquitecto Bruno Soares. Além do voto de qualidade, valeu-lhe a súbita ausência de Carmona Rodrigues, cujo voto contrário ao projecto se poderia revelar decisivo, tal como a inesperada abstenção dos vereadores comunistas.
Esta sucessão de coincidências evitou que a câmara se pronunciasse
negativamente sobre o trabalho de Bruno Soares - ainda que o estudo
prévio que este tem vindo a apresentar tenha sido alvo de fortes
críticas, quer de vários vereadores, quer de outros arquitectos (ver
outro texto). Mesmo assim, Bruno Soares comprometeu-se a alterar alguns dos aspectos mais polémicos do projecto, esbatendo
os losangos que desenhou para a placa central do Terreiro do Paço e
também o corredor de pedra que iria marcar, no chão, o percurso entre o
arco da Rua Augusta e o Cais das Colunas.
A respeito da sobreelevação da placa central relativamente ao Cais das
Colunas, o arquitecto mantém-se na sua: apesar de todas as objecções de
que a ideia tem sido alvo, insiste em criar um desnível entre a parte
da placa central virada ao rio e a zona imediatamente em frente, de forma a
que quem chegue da Baixa veja o rio a partir de um plano mais elevado.
O desnível será vencido à custa de degraus e de uma rampa, destinada a
permitir o acesso de deficientes.
Mas os desníveis na praça não ficam por aqui. Depois de ter percebido
que a parte poente das arcadas está afundada porque o edifício abateu
durante a sua construção, após o terramoto de 1755, Bruno Soares
resolveu realçar esse desnível, hoje imperceptível, instalando uns
degraus no passeio que corre junto às arcadas. O projecto prevê ainda
mais degraus em redor da estátua de D. José, para salientar a sua
importância. Reagindo às críticas, o arquitecto promete rever o desenho
dos vários lances de escadas.
"Uma enormidade" foi a expressão que a vereadora do PSD Margarida
Saavedra usou para descrever o estudo prévio de Bruno Soares. A também
arquitecta entende que os degraus irão criar barreiras à circulação dos
peões, fragmentando a sua unidade enquanto espaço único e amplo.
As críticas do PCP e do grupo de vereadores de Carmona Rodrigues à
forma como o processo tem sido conduzido apontavam para que a contagem
dos votos obrigasse à reformulação do estudo prévio. Afinal, assim não
aconteceu. O movimento cívico Forum Cidadania mostrou-se estupefacto
por o resultado da votação não ter tido correspondência com as posições
destes vereadores. Segundo o gabinete de Carmona, a sua ausência
deveu-se à necessidade de ir prestar declarações ao Ministério Público
no âmbito do caso Bragaparques.
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