in Público, 28.04.2009, Ana Henriques
O projecto de dividir o Terreiro do Paço ao meio com uma passadeira de pedra, para assinalar o percurso entre o arco da Rua Augusta e o Cais das Colunas, foi ontem recebido com inquietação por vários dos participantes numa conferência dedicada às praças da Europa que decorreu no Centro de Informação Urbana de Lisboa. Apesar de o autor do projecto de reabilitação da Praça do Comércio, Bruno Soares, ter estado presente no debate, ainda não foi desta que foram tornados públicos os desenhos que poderão tornar mais claro o que pretende fazer este arquitecto do local.
Bruno Soares disse que ainda não tinha chegado a altura de os mostrar. Ao certo, sabe-se que o projecto que a sua equipa está a elaborar para
a Sociedade Frente Tejo, entidade encarregue de recuperar para o
usufruto da população alguns troços da zona ribeirinha, prevê o
alargamento em 20 metros dos passeios junto às arcadas do lado poente e
nascente, de modo a que ali possam ser instaladas esplanadas. Já a
placa central deverá estar liberta desse tipo de equipamentos. Para o
arquitecto, é um erro fazer comparações entre o Terreiro do Paço e
algumas praças espanholas com esse tipo de ocupação no seu centro, como
Salamanca ou Valladolid, uma vez que se trata de locais com
características diferentes: desde logo a dimensão - a praça portuguesa
é muito maior -, e depois a situação geográfica da Praça do Comércio,
que é aberta ao rio. "É inóspita, tem muito sol e vento. Seria um
grande erro colocar quiosques e esplanadas no centro para fazer com que
as pessoas para lá fossem", observou. Também por questões de escala,
Bruno Soares pensa não ser de voltar a colocar no local as árvores que
já lá existiram no final do séc. XIX: se fossem suficientemente
imponentes tapavam os edifícios; se fossem demasiado pequenas ficariam
ridículas numa praça tão grande. Quanto à passadeira, servirá para
encaminhar os peões em direcção ao rio - segundo o arquitecto, não fará
grande contraste com o restante pavimento da praça, devendo ficar ao
mesmo nível que este. Conhecida pelo seu desempenho à frente de vários museus, a historiadora
de arte Raquel Henriques da Silva não hesitou em admitir as suas
reticências em relação a vários aspectos do projecto. Além da
inquietação que demonstrou sobre a passadeira para os peões, criticou a
prevista abertura de um hotel de charme num dos edifícios do Terreiro
do Paço. "E a ocupação das arcadas apenas com funções comerciais e
turísticas é um erro", preveniu. O que Raquel Henriques da Silva
gostaria de ver no local era um pólo do Museu da Cidade dedicado à
época pombalina que permitisse aos turistas perceber a história do
sítio. E, acima de tudo, que a intervenção a que a Praça do Comércio
vai ser sujeita seja mínima. Quanto à animação domingueira ali promovida pela autarquia, a
historiadora de arte espera que não regresse, porque se tratou "de um
desastre absoluto".
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