I – Os Planos Municipais têm “natureza regulamentar”, normativa, e como regulamentos que são, não projectam os seus efeitos para o passado, ou seja, não têm efeitos retroactivos. II – Ao estabelecerem “o regime de uso do solo, definindo modelos de
evolução previsível da ocupação humana e da organização de redes e
sistemas urbanos e, na escala adequada, parâmetros de aproveitamento do
solo e de garantia da qualidade ambiental”, tais instrumentos devem
conformar-se com normas de valor hierárquico superior,
nomeadamente as
que, à semelhança do disposto no artigo 60º do RJUE, estabelecem que
“as edificações construídas ao abrigo do direito anterior e as
utilizações respectivas não são afectadas por normas legais e
regulamentares supervenientes” [nº 1], ou que “a concessão de licença
ou autorização para a realização de obras de reconstrução ou de
alteração das edificações não pode ser recusada com fundamento em
normas legais ou regulamentares supervenientes à construção originária,
desde que tais obras não originem ou agravem desconformidade com as
normas em vigor, ou tenham como resultado a melhoria das condições de
segurança e de salubridade da edificação” [nº 2]. III – A sentença recorrida interpretou o nº 1 do artigo 68º do
Regulamento do PDM de Vila do Porto – que apenas permite trabalhos de
manutenção de muros e edificações existentes à data da sua publicação
no DR – no sentido da sua subordinação ao nº 2 do artigo 60º do RJUE,
ou seja, aos dois objectivos que aquele preceito pretende
compatibilizar: por um lado, a chamada garantia de existência activa,
da qual é titular o proprietário ou utilizador do prédio; e, por outro
lado, a não afectação das finalidades consagradas nos planos que
vigoram sobre as áreas em causa, que correspondem, imediatamente, ao
interesse público. IV – É essa preocupação de “justa ponderação e superação dos conflitos
de interesses coenvolvidos nos planos” que está plasmada no artigo 60º
do RJUE. V – O citado preceito do Regulamento do PDM de Vila do Porto não previu
a possibilidade de obras de reconstrução, ou seja, na expressão da
alínea c) do artigo 2º do RJUE, das obras de construção subsequentes à
demolição total ou parcial de uma edificação existente, das quais
resulte a manutenção ou a reconstituição da estrutura das fachadas, da
cércea e do número de pisos, contando que as mesmas não originem nem
agravem a desconformidade com as normas em vigor. VI – Por isso, é acertada a conclusão contida na sentença recorrida,
quando considerou que uma interpretação adequada da lei deveria
levar-nos a concluir que na estatuição do artigo 68º, nº 1 do
Regulamento do PDM de Vila do Porto, o legislador disse menos do que
queria. VII – Estando assente que o projecto em causa visa a (re)construção
duma edificação idêntica à que existia no prédio, antes da sua ruína,
tal não origina nem agrava desconformidade com as normas invocadas pelo
acto administrativo, podendo dizer-se, ademais, que não acarreta
alteração “da identidade do edifício originário”, sendo relevante, na
perspectiva assinalada, que o projecto se integra no âmbito da
protecção de interesses da recorrida, titulada pelo nº 2 do artigo 60º,
e, simultaneamente, não colide com o interesse público que o mesmo
acautela, na concretização que dele foi feita pelo acto impugnado. Secção: Contencioso Administrativo - 2º Juízo Data do Acordão: 13-03-2009
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