Público, 19.04.2008, Idálio Revez
Os municípios algarvios terão que se entender entre si para a localização de mais 24 mil camas turísticas, nas zonas do interior. O desafio da construção de resorts na serra foi lançado com a aprovação do Plano Regional de Ordenamento do Território (PROT)-Algarve, em Maio de 2007, mas a discussão vai começar agora. A ideia, em princípio, foi bem recebida, mas há o receio de não existirem promotores interessados, uma vez que estão aprovadas cerca de 80 mil camas, por via dos chamados direitos adquiridos de alvarás antigos, quase todas situadas na faixa litoral.
A Região de Turismo do Algarve (RTA) deu ontem início ao ciclo de
debates - Turismo, o Farol da Economia Regional - convidando
arquitectos, agentes económicos e autarcas para a discussão dos Núcleos
de Desenvolvimento Turístico (NDT) -, uma oferta que privilegia o
turismo localizado fora da faixa litoral. O presidente da RTA, António
Pina, justifica a iniciativa: "Chegou a altura de não repetir os erros
do passado, e dos vizinhos espanhóis". A aposta, sublinha, "está na
diversificação da oferta e na qualidade". O presidente da Associação Municípios do Algarve, Macário Correia,
acrescentou que já recebeu potenciais candidatos a investir na serra,
mas o êxito foi reduzido. "As prospecções foram várias, concretizações
muito poucas". E aponta como razão a burocracia: "É fácil aprovar um
empreendimento abaixo da Via do Infante, mas acima cria-se dificuldades
tremendas para meia dúzia de camas - é paradoxal e um contra-senso."
Sobre a localização dos NDT (24 mil camas), Macário Correia reconhece
que "não vai ser fácil, mas é possível, pois já nos entendemos noutras
ocasiões". O vice-presidente da Comissão de Coordenação e
Desenvolvimento Regional (CCDR-Algarve), Porfírio Maia, lembrou, a
propósito do aumenta da oferta turística, que é necessário pensar nos
recursos hídricos: "Eventualmente, temos de equacionar formas de captar
água". Os estudos efectuados, no âmbito do PROT, apontam para um
aumento na ordem dos 18 a 20 por cento. "O Algarve gasta mais água per
capita do que a vizinha Andaluzia", sublinhou. Macário Correia
contrapõe: "Temos [a barragem de] Odelouca em obra, e perspectiva-se a
da Foupana."
Da associação ambientalista Almargem (uma das entidades que participou
na elaboração do PROT-Algarve), Luís Brás disse ao PÚBLICO que "não há
ordenamento que resista":"O número de camas aprovadas ou a aprovar em
breve somarão 81.295".
Os licenciamentos foram obtidos no período de transição do PROT, e não
contam para a contabilidade das 24 mil camas. O primeiro-ministro, José
Sócrates, no fim do mês de Julho do ano passado, antes da publicação do
PROT em Diário da República e no contexto do programa Governo Presente,
anunciou, em Lagos, mais 5400 camas para a região e os empresários
prometeram investimentos de 1500 milhões de euros.
a Os direitos adquiridos "não podem ser eternos", diz Macário Correia.
Quem possui um alvará para poder construir, "seria desejável que
durasse dois a três anos". No entanto, reconhece que, na prática, desde
há 17 anos - quando foi aprovado o primeiro PROT - se invocam os
"direitos adquiridos" a vários títulos, a favor dos promotores.
Diz a Almargem que as mais de 80 mil camas licenciadas, ou em vias de
aprovação, antes da entrada em vigor do PROT, representam o
"pseudodesenvolvimento à custa do betão. A região prepara-se para
carregar mais 160 mil habitantes e uma dezena de campos de golfe, a
juntar aos 39 que já existem".
No que respeita às propostas do PROT para o interior da região, o
vice-presidente da CCDR, Porfírio Maia salientou a "transparência" do
processo, por colocar em pé de igualdade os candidatos às 24 mil camas,
inseridas nos Núcleos de Desenvolvimento Turístico. Os potenciais
investidores não necessitam de ser donos dos terrenos, mas o
Observatório do PROT, frisou, é que vai ditar as regras.
Luís Brás, da Almargem, diz que "o problema está naquilo que já foi
aprovado ao arrepio do plano". E cita o facto de em 28 de Dezembro o
Conselho de Ministros ter aprovado uma resolução, a justificar uma
medida de excepção, para "encaixar mais 18 mil camas, de projectos
pendentes, concedendo mais um mês para os projectos serem aprovados
pelas assembleias municipais".
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