Publico, 10.04.2008, Luís Filipe Sebastião
O licenciamento camarário para a recuperação da antiga pensão Bristol, no centro histórico de Sintra, foi declarado nulo pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra. A decisão condenou ainda a autarquia por "litigância de má-fé", nomeadamente pelo desconhecimento demonstrado das regras do Plano Geral de Urbanização de Sintra. Segundo anunciou ontem o presidente da autarquia, Fernando Seara (PSD), na reunião privada do executivo, aquele tribunal decidiu a favor do Ministério Público, que pedira a declaração judicial da nulidade do licenciamento para a recuperação da antiga pensão Bristol, aprovado por despachos de Dezembro de 2004 e Junho de 2006.
A decisão, de acordo com informações recolhidas pelo PÚBLICO, declara
nulo o acto de licenciamento camarário, por violação do Plano Geral de
Urbanização de Sintra, de Etienne de Groer. Mas a sentença vai mais
longe e condenou a câmara sintrense como "litigante de má-fé",
designadamente por ter demonstrado não conhecer as regras de um plano
que tem por missão fazer respeitar. Os cofres municipais terão, assim,
que suportar o pagamento de uma multa e as respectivas custas do
processo.
A participação do procurador da República junto do Tribunal
Administrativo e Fiscal - que determinou o consequente embargo da obra
- foi desencadeada por uma queixa do vereador Baptista Alves (CDU), que
alertou que o aumento da área de construção admitido no projecto, em
pleno centro histórico de Sintra, e na área classificada como
património mundial pela UNESCO, violava o plano de Groer.
O projecto, que manteve a volumetria dos três pisos, ampliava um dos
lados do imóvel e ocupava o logradouro com outros dois pisos. No
entanto, o Ministério Público concordou com a denúncia do autarca
comunista, segundo o qual a obra contraria o plano para a zona, que
proíbe o aumento de densidade, quer em superfície, quer em altura, e
que só admite alterações e reconstruções para "melhorar e sanear" os
edifícios existentes.
"Estamos a analisar [a decisão] e pelo menos no que diz respeito à
litigância de má-fé vamos recorrer até às últimas instâncias", afirmou
o presidente Fernando Seara, acrescentando apenas que o município
sintrense "avaliará mesmo mecanismos de responsabilidade inerentes a
essa matéria".
"A judicialização das competências urbanísticas das câmaras municipais
era um desastre para o país", comentou, por seu lado, o vereador do
Turismo, João Soares, que embora tenha afirmado não conhecer a decisão
do tribunal, por ainda não ter sido distribuída ao executivo, lamentou
a declaração de nulidade anunciada pelo presidente.
O autarca socialista, que sempre apoiou a obra da antiga pensão
Bristol, criticou também "o acto de deslealdade" do vereador da CDU por
ter recorrido ao tribunal para "bloquear um projecto de requalificação
de um edifício no centro histórico que esteve a degradar-se durante
dezenas de anos".
O vereador Baptista Alves também só conhecia da decisão o que foi
comunicado pelo presidente da autarquia, mas ressalvou que "não houve
qualquer deslealdade, porque antes do recurso ao tribunal foram feitas
várias intervenções em sede camarária a chamar a atenção para a
ilegalidade do projecto". E rematou: "Fico satisfeito por ver que a
justiça agiu, mas não me posso congratular porque certamente vai haver
prejuízos para a câmara municipal e já houve danos para o património de
Sintra."
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